"Quem viaja só, abre-se ao mundo.
A ideia de solidão mete medo a muita gente, mas na realidade quase nunca nos sentimos sozinhos a viajar sem companhia. A solidão é muito mais comum no dia-a-dia, sob a forma da indiferença e da banalidade nas relações profissionais e familiares; do que em viagem, onde cada relacionamento, até a simples troca de saudações pela compra de um cacho de bananas na mercearia da esquina, se reveste da intensidade dos actos estudados e irrepetíveis. Parece um paradoxo, mas é pelo próprio facto de não estarmos acompanhados que estamos disponíveis para outras companhias.
Estamos constantemente a conhecer pessoas: por vezes, os habitantes dos lugares que visitamos; mas, com mais frequência, outros viajantes que, como nós, visitam esses lugares. Os interesses e as preocupações são comuns, a solidariedade nasce espontaneamente. Uma característica óbvia das amizadesem trânsito é a curta duração. Uns dias juntos, e depois as estradas bifurcam-se de novo. Talvez por o prazo de validade ser tão breve, ou talvez porque a andar pelo mundo sentimo-nos mais vulneráveis, a verdade é que as amizades feitas em viagem adquirem uma força inoxidável."
-CADILHE, G. (in A LUA PODE ESPERAR)